Quando nossas propensões nos acorrentam

Em sua maioria, somos bem intencionados ao tentar ajudar pessoas e empresas a melhorarem seus processos e a sucederem em seus desafios de transformação. Mas como fazer isso quando estamos acorrentados por nossos próprios processos, manifestos e escolas de pensamento?

No livro “Uma Canção de Natal” de Charles Dickens, uma obra determinante para conhecermos as celebrações de Natal da forma a qual conhecemos hoje, Scrooge, um operador de negócios com muito apego ao prestígio e poder, se vê perseguido ao longo de todo o livro por espíritos dos natais do passado, presente e futuro.

Em um dos trechos, ele observa de forma apavorada uma Londres repleta de fantasmas acorrentados uns aos outros que vagueiam pela cidade cheios de sofrimento. Tais correntes, que os impedem de interferirem nos assuntos humanos, mesmo quando bem intencionados assim gostariam, representam seus hábitos e preferências de quando ainda eram vivos.

Assim como Scrooge e os fantasmas, todos nós temos nossas preferências e propensões, mesmo quando não as reconhecemos, e mesmo quando estamos bem intencionados. Essas propensões, muitas vezes, nos acorrentam por completo, como na história de Dickens. Elas nos levam a um comprometimento tão forte com nossas boas intenções, e com o glamour em volta disso, que não nos permitem enxergar a realidade em nossa volta.

Reconhecer as nossas propensões é um primeiro e muito importante passo para nos levar a interferir de forma coerente nos assuntos de uma organização que buscamos melhorar. Reconheça que você tem propensão a sempre achar que tudo é complexo, ou que tudo é óbvio, que descentralização é a solução para as empresas, que mudando o mindset tudo se resolve, que times são melhores que áreas, que Agile é a solução, ou que “basta olhar o fluxo”, que hierarquia e burocracia representam “o mal”, … reconheça que você está cheio de correntes à sua volta, que lhe prendem nas suas preferências e propensões, e o impedem de ver e agir de acordo com a realidade dos humanos que habitam aquela empresa.

Suas correntes podem ser lindas, coloridas ou clássicas, formais ou informais, mas mesmo correntes com ouro e diamante continuam a ser correntes e, portanto, continuam a lhe acorrentar.

No livro “Learnig 3.0: How Creative Workers Learn” que publiquei em 2015, aponto que um dos pontos chave para a aprendizagem e consequente evolução do profissional criativo é que ele se mantenha aberto para escolas de pensamento diferentes da sua, e que quando se veja muito influenciado por uma delas, dê alguns passos para trás, visite outras, e não se deixe acorrentar por nenhuma delas.

Neste Natal, convido você a fazer uma leve mas profunda reflexão sobre quais são suas correntes profissionais, e sobre como você poderia enfraquece-las ao longo do próximo ano.

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